terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

A Escolha de Yasmeena - OPINIÃO




Yasmeena é afortunada. Tendo nascido no seio de uma família árabe, uma cultura com preconceitos profundamente enraizados relativamente às mulheres, teve a sorte de ter um pai que não se envergonha de ter uma filha mulher e que se orgulha da beleza e inteligência da filha e que a apoia quando esta decide ter alguma independência e dá prioridade a arranjar um trabalho em vez de um casamento, como acontece na grande maioria das famílias árabes.
Yasmeena consegue trabalho numa companhia aérea e conhece vários países pelo mundo fora. Até uma colega de Yasmeena lhe pedir para trocar um voo e a sua vida mudar para sempre. A nossa heroína vê-se encurralada no Kuwait, no dia que este é invadido pelo Iraque e está longe de imaginar o que lhe está para acontecer. 

Ainda que tenha amigos numa família kuwaitiana que lhe dá guarida, ao apoiar a resistência, ela acaba por ser capturada e levada para uma prisão de mulheres, um circo de horrores onde mulheres são abusadas dia e noite por soldados iraquianos, verdadeiros criminosos que violam, agridem, mutilam e, quando não querem mais aquela mulher, executam-na e pedem outra para usarem e se servirem.
Este livro mostra-nos a dura realidade da guerra, mostra-nos que em todas as guerras, a violação de mulheres acontece, independentemen te do extrato social, da cor da pele ou da idade. A escrita não poupa pormenores e é difícil alguma vez esquecer os relatos que li neste livro, quase como se sentisse o cheiro daquela prisão, o terror daquelas mulheres, o fedor daquelas celas, a falta de condições para as mulheres que todos os dias eram abusadas e que mal conseguiam passar o corpo por água.
Yasmeena preferiu usar a inteligência e a astúcia para quebrar o seu carcereiro. Tal como a autora, considero-a uma heroína, mas Yasmeena carrega o peso da tradição familiar e da cultura árabe. Sabe que sempre será vista como culpada pela sua violação e por tudo o que fez, apenas para sobreviver. Ela fez uma escolha.
Lana, outra prisioneira, com apenas dezasseis anos, decide que vai lutar enquanto viver contra o monstro que, três vezes por dia, a viola e a agride, quase até à morte. Um sádico pervertido que tem prazer em ver aquela menina a definhar, a gritar e a morrer lentamente. Uma história demasiado perversa, mas que infelizmente foi real. Tudo o que a autora nos relatou é verídico. Aconteceu e continua a acontecer em todo o mundo.

É uma leitura extremamente emotiva e forte a vários níveis. Deixa-nos perplexas, indignadas e revoltadas por estas coisas continuarem a acontecer. 
Gostava que a autora nos tivesse dado certezas quanto ao destino de Yasmeena. O que decidiu depois a nossa heroína, depois de se ter salvo? Pelo menos essa certeza temos, que sobreviveu ao inferno.
A autora partilhou com o leitor várias fotografias e, no final, também nos fez um resumo do contexto histórico do Kuwait e do Iraque. Gostei imenso de ficar a saber um pouco mais sobre a história e os conflitos nestes países e agradeço à escritora por o ter feito.

Um livro que devia ser de leitura obrigatória. Mesmo para quem não gosta deste género de livros, é uma obrigação saberem da existência destas atrocidades.

1 comentário: