A Pior 2ª feira da Minha Vida!

Chego ao trabalho feita num farrapo, por razões que agora não interessam, vejo o INEM e sei que algo não está bem. Vou a correr para o Hospital com uma utente que não está bem. A mesma utente que na semana passada fez 90 anos e que teve a família quase toda vinda da África do Sul, reunida à sua volta. A tristeza dela era não ouvir, coisa que aconteceu à cerca de 3 meses. Na semana passada falei com uma otorrino e ela prometeu que a via no hospital no dia seguinte (6ª feira). Fiquei toda contente e ainda mais contente quando lhe fizeram o teste da audição e ela começou a levantar o dedo sempre que OUVIA o pipi da máquina, com uma emoção no olhar que me é impossível descrever. Agora era só falar com a família para saber se podíamos avançar com um aparelho auditivo, pois ía melhorar qualitativamente a sua vida e ía permitir que não se isolasse tanto.
Mas hoje tudo mudou. Ela foi com o INEM e eu fiquei á espera de noticias, quando a médica veio falar comigo vinha com aquela cara…aquela cara que não queremos ver pois sabemos que algo não está bem. Na altura disse-me que o diagnóstico era muito muito reservado e que era melhor avisar a família. Acho que na cabeça da médica eu devia saber traduzir aquilo em respostas…em respostas às perguntas da família. Eu fico ali com as perguntas que quero fazer, que saltitam na minha cabeça aos trambolhões mas que não saem da minha boca. É melhor avisar a família?? E digo exactamente o quê? No estado emocional em que estava (tipo, menos 100) desatei a chorar ali no SO. Ligo à médica da instituição mas a voz ainda sai trémula e embargada. Ela tenta acalmar-me e dizer que fizemos tudo o que podíamos. Mas eu quero fazer mais! O que posso fazer? Digam-me que eu faço!!
Ligo á filha e dou a informação que tenho e sugiro que ligue para o hospital para tentar falar com a médica. Mas disse-lhe que a situação era complicada.
Volto para o trabalho e está na hora de levar um utente para um exame. Esse senhor não anda bem e parece-me muito deprimido, muito por causa das dores que tem. Ajudo a fazer o exame e peço ao médico urgência no resultado. O qual simpaticamente me disse que o podia levar hoje (em vez do suposto dia 17 de setembro). Como já eram 14h30 levei o senhor para a instituição para almoçar e volto para a Clínica para ir buscar o resultado e ir a outra Clínica. Quando a enfermeira me liga porque o senhor tinha vomitado (como já tinha acontecido ontem) e que ía para o hospital. Combinei então ir lá ter e levar os exames que tinha comigo. Fui almoçar pois eram 15h30 ainda não tinha comido nada (de manhã porque não tinha fome e ao almoço porque não houve tempo). Comi no Mc Donald’s (não por ter fome, porque não tinha, mas para ver se algo em mim melhorava e me animava. Não resultou). Sigo para o Hospital e troco de lugar com a enfermeira. Ao fim de 4 horas é visto pela médica que chama um cirurgião e decidem que fica internado para ser operado, pois as hérnias que tem estão a começar a estrangular o intestino.
Enquanto esperávamos, ligo a filha da utente da manhã (que sabia ainda não ter ligado para o hospital pois encontrei lá a médica e perguntei se tinha falado com algum familiar. Ela diz que não e pergunta quando a senhora falecer quem contactamos?)) e digo que estou no hospital, que falei com a médica e que com base no diagnóstico aconselhava a virem já! Ela pergunta “É assim tão grave?”…silêncio…Eu ouço-me dizer “Sim!”…choro…choro…pi pi pi…e fico a chorar também do lado de cá! Mais tarde volta a ligar-me. Ela diz-me que tava para ligar para o hospital, mas estava à espera do irmão. Liga-me novamente a dizer que a médica não dava informações dessas por telefone e como eu estava ali se podia falar com a médica e dizer-lhes o diagnóstico exacto. Ok. Mando chamar a médica, explico a situação (é verdade, o resto da família estava com ela no aeroporto a decidir se embarcava ou não para a África do Sul). Diagnóstico: insuficiência renal grave (os rins já não funcionavam) e insuficiência cardíaca. “Está em coma?” “Não!” “Probabilidade de resistir?” “Muito muito baixa” (com uma cara que dizia: zero). Ligo de volta e falo com a nora da utente e explico o melhor que posso o que a médica me disse (claro que eliminei a parte da cara da médica). Ela percebeu e disse que iam decidir o que fazer. Disponibilizei-me para tudo o que fosse necessário.
Agora amanhã é outro dia. Não sei como será. Sei que o sol vai ter que nascer outra vez. É a única coisa que sei neste momento.